Causar um acidente de
trânsito e fugir do local é crime, mesmo que não haja vítima. Conforme
previsão do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), essa atitude caracteriza fuga
à responsabilidade penal ou civil que possa ser atribuída ao condutor, e pode
gerar detenção de seis meses a um ano ou multa de acordo com o artigo 305.
Mesmo
a previsão não sendo nova, muitos debates ocorreram nos últimos anos nos
tribunais brasileiros. A alegação era de que esse crime seria inconstitucional,
pois implicaria que a pessoa criasse provas contra si mesma, o que seria ferir
um direito fundamental. A discussão chegou até o Supremo Tribunal Federal, em
2020, que fixou o entendimento de que não se trata de uma questão
inconstitucional.
O professor e advogado Gabriel Habib explica que o STF entendeu que,
nesse caso, não se trata de um direito individual. “Exige-se que a pessoa fique
ali para colaborar com a investigação penal e também eventual apuração de
responsabilidade civil. O bem tutelado é administração da justiça, que fica
prejudicada pela fuga do local, uma vez que impede sua identificação, e
consequente apuração do ilícito para fins de se promover a responsabilização”,
diz. E completa: “pode até acontecer de que permanecer no local seja atestar,
confirmar, que a pessoa não teve nenhuma contribuição no evento lesivo, naquele
acidente, naquele resultado. Pode haver testemunhas, então, não
obrigatoriamente, a pessoa ficar no local do acidente vai se autoincriminar”,
explica.
Contudo, quando há vítimas, o condutor que fugir também infringe o artigo 304 do CTB, que
prevê infração para quem deixa de prestar imediato socorro à vítima ou
solicitar auxílio médico. Além disso, o condutor também responde criminalmente
por todas as ações que o acidente possa gerar, como por exemplo, homicídio
culposo no caso de óbito da vítima.
Levantamento do Respeito à Vida,
programa da Secretaria de Governo do Estado de São Paulo, coordenado pelo
Detran SP, mostra que o risco de morte em acidentes de trânsito triplica quando
há fuga do condutor. Em 2020, cerca de 85% dos acidentes com abandono do local
pelos condutores ocorreram em vias urbanas, que também abrigam a maior parte
das fatalidades (54%). Em 64% dos casos os acidentes ocorreram no período
noturno. Os tipos de acidente mais comuns são os atropelamentos e as colisões
traseiras (26% cada).
Segundo o estudo, entre janeiro e setembro do ano passado, houve 4.152
ocorrências com fuga do condutor. Também foi identificado que acidentes com
este perfil culminaram na morte de 331 pessoas. Dessas vítimas, 47% eram
pedestres, seguidas por motociclistas (32%), ocupantes de automóveis (13%) e
ciclistas (8%).
“O
trânsito seguro é feito de colaboração. Prestar socorro, permanecer no local,
ajudar as autoridades e envolvidos é sinal de solidariedade e respeito. A
omissão aumenta o risco nas vias, além disso, com a crescente expansão no uso
de videomonitoramento, achar que é possível fugir da sua responsabilidade só
demonstra que o condutor não está preparado para conviver no trânsito”, comenta
Luiz Gustavo Campos, especialista em trânsito e diretor da Perkons.
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